Pagar ou não pagar, eis a questão: o ICMS entre estabelecimentos e a ADI 49

Se os estabelecimentos A e B estiverem dentro do mesmo Estado, deve-se olhar a legislação estadual que rege esse tipo de operações, e se poderá constatar que, em alguns deles, é permitida a apuração concentrada do ICMS, ou seja, reúne-se todas as operações que envolvem o ICMS dentro do mesmo estado e os créditos acumulados no estabelecimento A servirão para quitar os débitos correntes que surgirão no estabelecimento B, e, com isso, o problema deixa de existir. Ocorre que nem todos os estados permitem esse tipo de apuração concentrada, e, nestes, o problema persistirá.
Por outro lado, para as operações interestaduais não existe atualmente solução normativa que permita uma apuração concentrada. Logo, se os estabelecimentos A e B estiverem em estados diferentes, inexoravelmente haverá a acumulação de créditos em A, e o pagamento de ICMS em B. Mais uma vez, aflora o problema de caixa.
O problema está identificado entre a convicção jurídica e a apuração contábil, que fatalmente ocorrerá nas operações internas (em alguns estados) e em todas as operações interestaduais que envolverem a transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular. E se trata de um problema de caixa do contribuinte/comerciante, que poderá ser perene.
Exposto o problema, qual a solução?
Arrisco algumas sugestões, pois, embora pouco conheça de contabilidade, escrevo semanalmente nesta ConJur sobre Direito Tributário (às segundas, compartilho esta coluna Justiça Tributária com Raul Haidar) e sobre Direito Financeiro (às terças, em semanas alternadas, divido a coluna Contas a Vista com Élida Graziane Pinto).
O ideal é que surja uma norma permitindo que o comerciante transfira os créditos entre seus estabelecimentos, através da nota fiscal de transferência, mesmo quando não realize vendas. Essa norma pode ser oriunda do Congresso (uma lei) ou do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). Não há dúvida que a primeira hipótese é a ideal, mas nem sempre advém com a agilidade necessária. A segunda hipótese seria mais ágil, todavia, dificilmente ocorrerá, pois isso implicará em queda de arrecadação. Ficarei feliz se estiver errado nesse âmbito.
Outra possibilidade é isso vir a ser decidido pelo STF, em sede de ações originárias, ou no curso da ADC 49 (embargos de declaração ou reclamação — a conferir), pois o problema jurídico inegavelmente foi bem equacionado, mas não o financeiro. Logo, será necessário que o STF se manifeste sobre esse específico aspecto, sob pena de os contribuintes/comerciantes terem juridicamente ganho o processo, mas o terem perdido financeiramente.
Uma terceira possibilidade que vislumbro, esta, sim, completamente inserida no manicômio tributário, é de os comerciantes continuarem a pagar o imposto, mesmo sendo indevido — e mesmo sabendo que é indevido — a fim de transferir esses créditos de ICMS em conjunto com as mercadorias transferidas. Deve se tornar um caso único na literatura tributária mundial: para economizar, os contribuintes passam a pagar um tributo que sabem juridicamente indevido. Eis a dúvida hamletiana do contribuinte neste caso: pagar ou não pagar, eis a questão.
Tudo isso aponta para a necessidade de reforma do sistema de tributação do consumo no Brasil, mas que deve vir no bojo de uma completa reforma tributária, com R maiúsculo, e não as reformas fatiadas e meias-solas que estão sendo propostas.
Completamente louco tudo isso, não? O manicômio tributário de Alfredo Augusto Becker está presente e sendo disseminado.
Fonte: Consultor Jurídico
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